segunda-feira, 28 de março de 2011

Brasil - A BR101

Acordei com um sol radioso que penetrava à força por entre as frestas das persianas de madeira rombas que compunham a janela do quarto. O dia começou cedo. Nestas latitudes, por volta das cinco e meia da manhã, já o sol vai alto e os odores do café da manhã infiltram-se por baixo das portas dos pequenos apartamentos que circundam a zona dos pequenos almoços.Viajamos por nossa conta e risco, o que se revela a melhor forma de ficarmos livres de compromissos, horários, agendamentos e esquemas de grupo que acabariam por restringir a nossa mobilidade durante as férias. Sentamo-nos virados para a foz do rio Ceará Mirim, espelhada por um sol intenso que, desde manhã cedo, cobre as últimas braçadas que se contorcem até ao mar. Em redor, o pequeno estuário é circundado por palmeiras e casas de veraneio que nesta altura do ano, se encontram encerradas. Ao pequeno-almoço fazemos planos para os próximos dias. Munidos do “Guia Quatro Rodas" decidimos seguir para sul. O destino será a praia de Carapibus, no Estado do Paraíba, localizada a 150 Km a sul da cidade do Natal. Garantiram-nos que era um dos refúgios da região. Pouco conhecido, preservado do assalto dos grandes resorts e da massificação das cadeias de hotéis, parecia-nos o local ideal para os próximos dias. A estrada até lá, seria a maior e a mais famosa do Brasil. A BR101, com uma extensão de mais de 4.000 quilómetros, tem início no Rio Grande do Norte, na pequena cidade de Touros, descendo ao longo de toda a costa Nordestina, seguindo até ao ponto mais a sul do país, curiosamente denominado São José do Norte, localizado no Estado do Rio Grande do Sul. Saímos a meio da manhã. A estrada tem um movimento intenso. Camiões de grande envergadura, cruzam-se connosco levando pesadas mercadorias aos pontos mais recônditos do país. O tráfico é intenso e quase todo o percurso corre por dentro de pequenas povoações. As condições de habitabilidade são precárias. É visível a falta de saneamento básico, de infraestruturas e de uma população que se debate com o desemprego e com a reivindicação da posse da terra. Ao longo da estrada, vamos atravessando manifestações silenciosas. Pequenos aglomerados de cabanas feitas de canas e tectos de palha dão o mote para identificarmos os Sem-Terra. Assentam casa nas bermas evidenciando um profundo estado de carência e de marginalização social. Despojados de quaisquer bens, aguardam, serenamente, que lhes seja atribuída uma pequena habitação social, normalmente construídas em pequenos grupos de ilhas de tijolo encarniçado, com depósitos de água no topo e uma invariável antena parabólica para os entreter nos dias de desemprego. Do meu lado direito, crianças correm em direcção ao carro, abanando pequenos sacos de cajú e frutas secas. Compro sempre para os incentivar e, claro, porque gosto de ver sorrisos claros quando lhes digo para ficarem com o troco. O pavimento é polvilhado por crateras imensas provocadas pelas chuvas intensas dos últimos dias, uma delas, tinha diâmetro suficiente para caber um carro lá dentro. Por estas razões, acrescida da ausência total de iluminação nocturna, são desaconselhaveis as grandes deslocações após o entardecer. Em viagens anteriores percorri vários troços da BR101, fazendo diversas incursões por estradas de terra batida até ao litoral, à descoberta desta ou daquela praia ou recanto onde havia promessas de visões de cortar a respiração. E às vezes chegamos a esses sítios, longe de tudo e que nos ficam para sempre na memória. O litoral dos Estados do Rio Grande do Norte, Pernambuco, Paraíba e Alagoas está pejado de praias maravilhosas, de uma beleza original, algumas apenas acessíveis por barco. Destaco uma delas, no Estado de Pernambuco (na fotografia, a cerca de 130 Km a sul do Recife), a Praia dos Carneiros perto de Tamandaré. É deslumbrante, quase deserta, com um acesso difícil, estando considerada entre as 10 praias mais bonitas do Brasil. Vale a pena a visita pelo sossego, pela calma que nos transmite, pela imensidão de palmeiras que crescem desordenadas ao longo de toda a praia que nos proporciona sombras fantásticas e um balanço de folhas ondulantes como música de fundo. A não perder. Fotogr:CRV

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